Educação

O mundo da universidade por quem é de quebrada

18.10.2018 | Por:

Todas as fotos por: Jeferson Delgado // Portal KondZilla

Aqui no Portal KondZilla estamos sempre falando sobre universidade e todo universo que permeia esse assunto. Já falamos sobre aquela pergunta famosa que todo jovem faz “Fiz 18 anos: devo trabalhar ou estudar?“, já falamos também sobre se você aprende uma profissão só na faculdade ou não e agora chegou a hora de falar da galera que está na universidade e veio da periferia. Perguntamos pro pessoal que estudando se eles estão encontrando o que imaginavam e como é ser quebrada estar nesse espaço. Chega mais, família.

Se você é de quebrada, provavelmente demorou uma cota para descobrir que existe faculdade de graça. É isso mesmo meus amigos e amigas, não se trata de bolsa de estudos ou essas coisas que a gente sempre vê quando está chegando época de vestibular, eu estou falando das universidades públicas.

O ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) é a principal porta de entrada para boa parte das universidades pelo Brasil. No entanto, algumas instituições têm seus próprios vestibulares, como a Universidade de São Paulo (USP). As inscrições pra essa “porta de entrada” nas universidades costuma ser salgada, geralmente passando dos R$100. No entanto, muitos candidatos podem se inscrever gratuitamente com um “atestado de pobreza“.

No estado de São Paulo, existem sete opções de universidades públicas: USP, UNESP, UNIFESP, ITA, UFSCar, UFABC, IFSP e a UNICAMP. O capital financeiro e o acesso a informação é decisivo nisso tudo. Quem tem mais consegue chegar primeiro em alguns espaços e na universidade não é diferente.


Matheus Santos, 21 anos, aluno de história

Nos debates do ensino médio sobre qual faculdade fazer, me lembro poucas vezes de citarem as universidades acima, ou simplesmente de surgir o assunto cursinho pré vestibular. E não foi apenas comigo que aconteceu isso. “Ninguém na escola pública me falou: cê você fizer cursinho, você passa. Vai pra cursinho e tal. Eu era aluno do noturno, eu nem sabia que existia cursinho popular, por exemplo”, diz Matheus Santos, aluno de história da USP.


Mariane Cardoso, 25 anos, aluna de audiovisual

“Quando eu tava no ensino médio, eu tinha uma professora que se dedicava muito, ela pegava muito no meu pé e me mostrou a possibilidade de fazer faculdade pública. Até então, eu sempre pensei que ia fazer ProUni, ia ter que fazer faculdade particular, eu nem sabia direito da existência de faculdade pública e foi ela que me apresentou a USP”, diz Mariane Cardoso, 25 anos, cria do Jardim São Luís, zona sul, e que cursa audiovisual na USP.

Devemos sempre lembrar que a qualidade do ensino público fundamental e médio não são dos melhores possíveis aqui em nosso país. No ranking da educação com 36 países, o Brasil fica em penúltimo, o que ajuda a explicar o porquê quem estuda em escola pública tem dificuldade nos vestibulares, por exemplo. Já no ensino superior público, a história é diferente, com 36 universidades brasileiras ficando entre as melhores do mundo. Essa defasagem de ensino, junto com os programas do governo, ajuda a explicar porquê uma galera de periferia prefere embarcar pro ensino superior pago.


Douglas Santos, 26 anos, aluno de letras

Já com Douglas Santos, 26, estudante de Letras e cria do Jd. das Rosas, zona sul de SP, e Junior David, 24, estudante de Geografia e cria do Jardim Brasil, zona norte, a história foi um pouco diferente. Eles começaram a fazer cursinho pré-vestibular, que basicamente é um curso preparatório com conteúdo de diversos vestibulares, por conta da namorada que cada um tinha na época. “Eu ia por causa da minha ex, ela que me incentivou a ir. Eu assistia umas aulas, mas não tinha muito a brisa de entrar na universidade pública, ficava pensando no que ia fazer da vida”, diz Douglas Santos.

Estar nesse mundo das universidades públicas não é algo tão simples assim, e os número confirmam isso claramente. A chance de um jovem da periferia entrar numa universidade pública é de apenas 2%, e quando consegue ter acesso, o jovem precisa vencer outro desafio que é a permanência na universidade e a convivência. Sendo assim, o sonho de se formar é mais treta ainda. Isso sem falar na expectativa que é criada sobre o conteúdo. Será que tudo que você estuda em uma universidade pública condiz com suas expectativas ou vivências?

“Escolher bem o curso que você quer fazer é fundamental. Entrar é um processo difícil, mas na minha visão você conseguir cursar e se manter é até suave. Ter vida é um bagulho mais difícil, principalmente em universidade pública. Acho que ter vida é você ter uma saúde mental em dia, tá ligado?! Vejo várias pessoas que se internam na faculdade, você vai conseguir fazer virar se você se internar porque nós, de quebrada, somos diferenciados, quando a gente quer, a gente faz. Mas é aquilo: você vai querer abrir mão da sua saúde mental pra isso?”, explica Junior David.

O choque cultural dentro desses espaços é grande, são pessoas diferentes, dos mais variados lugares e classes convivendo junto. Então, essa também é uma forma de você conhecer um mundo novo e abrir a cabeça pra novidades.

“Geografia é o curso que tem a maior média de alunos negros na USP, cerca de 20%, então eu chego a estudar com uma galera de quebrada na minha sala, tem um um mano das quebradas de Guarulhos, tem um outro de uma quebrada da sul” conta Junior.

Sim, fazer uma graduação – principalmente numa universidade pública – é uma experiência sensacional. Mas ela não é a única forma de entrar no mercado de trabalho ou ter uma profissão. Um exemplo disso sou eu. Sempre fui um péssimo aluno na escola e nunca me vi dentro de uma sala de aula. Quando obtive conhecimento sobre universidade e esse mundo que ela se encontra, queria mais distancia ainda. Só que aprendi uma profissão em uma escola de jornalismo, que faz da prática a sua teoria, ou seja, os alunos de jornalismo aprendem mais fazendo do que estudando livros. É fato que várias profissões dependem de uma graduação, medicina e direito são bons exemplos, mas hoje podemos recorrer a cursos que nos dão suporte para não precisar uma graduação logo de cara após o fim do ensino médio.

“Sou professor de história no cursinho popular do Núcleo Consciência Negra e falo isso pra todos meus alunos: a universidade é uma opção, mas não é a única opção. Antes de entrar em uma faculdade pesquise bem, converse com pessoas, vasculhe bem outros bagulho. Você quer fazer jornalismo? Faz de outro jeito. Quer fazer cinema? Faz de outro jeito. Tem várias outras opções que, às vezes, a gente não tem conhecimento”. Matheus Santos deu a letra sobre o que já falamos, estudar uma profissão não é somente na universidade.

É importante destacar que o conhecimento é fundamental pra gente conseguir avançar, seja no trabalho, seja na vida pessoal, em qualquer lugar. Hoje, sabemos também que existe diversas opções de ensino, curso técnico, graduação e até cursos livres que encaminham para o mercado de trabalho, então nada de desculpas, as dificuldades existem mas há opções de caminhos para seguir.

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